Prof. Dr. Rubens Feferbaum

1- Metabolismo protéico:

As infecções agudas aceleram a síntese e o catabolismo das proteínas corpóreas. Alguns mediadores endógenos que incluem citocinas e hormônios catabólicos como os corticosteróides estimulam o catabolismo de proteínas do músculo esquelético(CLOWES et al.,1983). Durante a infecção e trauma grave a proteína muscular sofre proteólise sendo rapidamente mobilizada para atender as necessidades de defesa orgânica na síntese de proteínas de fase aguda como a proteína C reativa (PCR) , anticorpos e imunoglobulinas entre outros (POWANDA;BEISEL,1982; BEISEL,1983).
Aminoácidos de cadeia ramificada são liberados durante a proteólise; a oxidação destes gera grupos amino-nitrogênio, que podem se ligar ao piruvato ou outras fontes de carbono pela ação da enzima transaminase. Este mecanismo molecular resulta na síntese "de novo" da alanina e glutamina dentro das células do músculo( O´DONNEL et al., 1976).
A captação dos aminoácidos pelo fígado altera suas concentrações plasmáticas na sepse sendo estimulada pela mesma Interleucina-1 que ocasiona proteólise.
Durante a sepse grave aumentam as concentrações plasmáticas de aminoácidos contendo enxofre como taurina, cisteína e metionina. Os aminoácidos são importantes substratos para a neoglicogenese hepática; o componente nitrogenado da alanina permite maior síntese de uréia, sendo este o principal processo de geração de uréia na infecção grave(BEISEL et al.,1980).
O balanço nitrogenado na sepse é negativo. Os processos catabólicos e a utilização dos aminoácidos para produção de energia contribuem para este fato.
Parte do balanço negativo é devido à anorexia ; no entanto a perda nitrogenada diária de um adulto com sepse situa-se em 20g/dia. Interessante notar que, este balanço negativo é pouco revertido pelo uso de nitrogênio exógeno (BEISEL1984;WANNEMACHER,1977).
LONG, 1979, através de estudos de balanço nitrogenado em diversas condições clínicas relatou perdas nitrogenadas de até 35g/dia que corresponde à perda de 1 Kg de massa magra por dia. A figura 4 mostra que a perda urinária de nitrogênio aumenta com a gravidade da doença ou trauma sendo proporcional ao aumento da TMB.
No entanto, foi demonstrada a obtenção de balanço nitrogenado zero ou discretamente positivo nos pacientes que receberam 1,5 à 2 g/Kg/dia de proteínas e que estão em moderado estado de hipermetabolismo(CERRA,1989). As fórmulas de uso parenteral enriquecidas com aminoácidos de cadeia ramificada teriam melhor efeito na incorporação protéica destes pacientes(BROWN et al.,1990; FREUND et al.,1978).
O RN séptico também apresenta-se hipermetabólico com catabolismo protéico que depleta os estoques de glutamina e alanina(45% do total de aminoácidos). A conseqüência é a grave atrofia da mucosa intestinal, com perda da função imunitária e facilitação da translocação bacteriana(LIPMAN,1995; FEFERBAUM et al.,2000 a).
Durante a nutrição parenteral no RN doente, a fonte de nitrogênio advém das soluções de aminoácidos cristalinos. Para que haja metabolismo protéico eficiente é necessário proporções adequadas de cada aminoácido. A presença de baixas concentrações intracelulares de aminoácidos pode ser conseqüente à diminuição de entrada destes no espaço extracelular, redução do catabolismo protéico ou aumento da sua utilização.
O desbalanço dos aminoácidos intracelulares nos pacientes com hipercatabolismo pode ser um dos problemas fundamentais da nutrição celular, afetando de forma adversa a síntese protéica.
Nas soluções parenterais atualmente utilizadas para o recém-nascido, as ofertas de glicina, fenilalanina, leucina e treonina são grandes, enquanto que as necessidades de valina, serina, lisina e histidina são relativamente pequenas para o paciente gravemente doente.
Os aminoácidos como glutamina, tirosina, cisteína e taurina não estão incluídos normalmente na nutrição parenteral por se apresentarem de forma insolúvel ou pouco metabolizável. Para melhor adequação nutricional estes aminoácidos deverão ser incorporados nas formulações de nutrição parenteral do RN( POINDEXTER et al.,2000).
Discute-se o papel da arginina como importante imunomodulador e precurssor do óxido nitríco na sepse ( KIRK;BARBUL,1990; KELLY et al.,1995; KEMEN et al. 1995).
A glutamina, especificamente, parece ser importante na manutenção do trofismo da mucosa intestinal e manutenção da barreira mucosa(POINDEXTER et al.,1999).
Os RN gravemente doentes e especialmente os pré-termos, apresentam imaturidade dos sistemas enzimáticos, limitando a produção de alguns aminoácidos como a cisteína (deficiência da enzima cistationase em pré-termos), taurina, gutamina e nucleotídeos como colina e inositol. Este fato torna estes nutrientes "condicionalmente essenciais " para estas crianças ( BOWER et al.,1995; FEFERBAUM et al.,2000 c).

2- Metabolismo de hidratos de carbono:

A sepse e outras infecções aumentam a produção de glicose em conseqüência da ação combinada de hormônios como o glucagon, catecolaminas e o cortisol que estimulam a ação da adenilciclase no fígado. A produção de glicocorticóides adrenais e hormônio de crescimento aumentam na sepse estimulando a glicólise e a neoglicogênese. Este aumento ocorre paralelo a um leve aumento na secreção e concentração plasmática da insulina,que não consegue suprimir a hiperglicemia ,mesmo em doses farmacológicas. Contribue também o aumento da disponibilidade hepática dos substratos necessários para a neoglicogênese em especial o lactato, a alanina e remanescentes de outros aminoácidos que apresentam três carbonos. As crianças e os idosos podem apresentar carência de nitrogênio lábil no músculo esquelético e podem evoluir com hipoglicemia, o que também pode ocorrer na sepse grave ou prolongada, após esgotar o depósito de aminoácidos endógenos corpóreos(BURKE et al.,1979; BEISEL,1980)

3- Metabolismo de gorduras:

O metabolismo de lipídeos na sepse não muda de maneira tão acentuada como o das proteínas e hidratos de carbono. No entanto, depósitos de gordura são fontes calóricas importantes e frequentemente estão depletados pela doença de evolução mais prolongada. O fígado durante a infecção mobiliza ácidos graxos e triglicerídeos. Ácidos graxos livres plasmáticos tendem a redução durante a sepse, embora a atividade da lipase lipoprotéica(LPL) aumente em função da presença das catecolaminas. A disponibilidade de carnitina pode limitar a oxidação mitocondrial dos ácidos graxos; assim, no stress grave, a carnitina pode ser essencial. A cetogenese está prejudicada e o fígado acumula um excesso de triglicerídeos durante a infecção, o que resulta em alterações histológicas características de esteatose hepática (CERRA et al.,1979;NEUFELD et al.,1980). Os lipídeos também apresentam função estrutural na membrana celular e têm papel na regulação imunológica sendo precursores dos eicosanóides como as prostaglandinas e leucotrienos. Ainda, no RN, particularmente pré-termo, os ácidos linoléico e linolênico são essenciais para a formação do cérebro e retina, na mielinização e proliferação celular(FEFERBAUM, 2000 b).
Faz-se importante observar que, altas concentrações de ácidos graxos podem ocasionar aumento da reação inflamatória, dos radicais livres e depressão da resposta inflamatória(WOJNAR,1995).

4-Vitaminas e minerais:

As informações a respeito do uso de vitaminas e minerais são escassas na sepse. Os níveis de ferro tendem a diminuir, o que de certa forma auxilia no combate à infecção. Aparentemente a demanda para vitaminas e micronutrientes está aumentada; estudos recentes mostram redução na concentração sérica das vitaminas A, C e E. A perda urinária destas vitaminas ocorre em paralelo ao balanço nitrogenado negativo verificado em crianças com sepse(BEISEL,1998).
Quanto aos micronutrientes, ocorre diminuição da concentração plasmática de ferro e zinco, explicada em função do grande fluxo destes micronutrientes ao fígado, onde a síntese de transferrina está aumentada pelas citocinas presentes na sepse.
No entanto, a suplementação de vitaminas, minerais e micronutrientes devem obedecer às necessidades específicas de cada faixa etária segundo as recomendações do RDA (ADAN et al., 1995; WOJNAR,1995).
Quanto aos eletrólitos, os íons fosfato e magnésio são importantes na manutenção da dinâmica respiratória adequada. A depleção destes íons ocasiona maior tempo de ventilação mecânica(AUBIER et al.,1985).